... Expressividade ...

"Decifra-me mas não me conclua, eu posso te surpreender! - Clarice Lispector

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A frase de Max Peters poderia facilmente estar escrita nas entrelinhas dos relatórios de clima organizacional, dos desabafos não ditos nas salas de reunião ou dos silêncios prolongados nas conversas de café. Ela não é só uma constatação... é um grito abafado de quem tentou demais onde o sistema já estava viciado de menos.

 

O adoecimento do comprometido

 

Na psicologia organizacional, há um termo que se tornou cada vez mais necessário: burnout moral. Não aquele esgotamento clássico do excesso de tarefas, mas o desgaste ético, emocional e existencial de tentar sustentar valores em lugares onde a cultura institucional os contradiz.

 

Segundo Christina Maslach, uma das maiores pesquisadoras sobre burnout, o desgaste emocional não nasce apenas do volume de trabalho, mas do conflito constante entre o que se acredita e o que se é obrigado a aceitar calado. Gente boa, nesse contexto, é aquela que tem ética, visão sistêmica, entrega, e que vê, dia após dia, suas tentativas sendo soterradas por decisões baseadas em vaidade, influência ou medo.

 

Filosofia da mediocridade institucional

 

Byung-Chul Han, filósofo contemporâneo, já apontava que vivemos numa era de positividade tóxica; onde críticas são vistas como negatividade e onde o excesso de performance encobre estruturas precárias. A meritocracia vira cortina para privilégios. A cultura de “aqui sempre foi assim” protege os que não querem mudança, não porque ignoram os problemas, mas porque se beneficiam deles.

 

Em ambientes assim, a estrutura se defende. Ela não quer ser salva… quer ser preservada. E quem tenta reformá-la vira ameaça.

 

O ciclo da bolha

 

A estrutura ruim muitas vezes está blindada por bolhas: pequenos grupos que se protegem, que validam uns aos outros independentemente da qualidade das entregas, que escolhem não ouvir vozes dissonantes. São ambientes que promovem a permanência dos medianos e isolam os inquietos. E quem se move pela excelência começa a duvidar de si, porque seu valor não encontra eco… encontra barreiras.

 

O resultado é um esgotamento silencioso. Pessoas que dormem pouco, pensam muito e sentem que estão em uma eterna corrida de hamster — muito esforço, pouco avanço. Não é preguiça. É frustração estratégica. E, muitas vezes, solitária.

 

Casos reais e invisibilizados

 

Não é difícil encontrar exemplos. Líderes que tentaram reorganizar processos e foram boicotados por equipes antigas. Técnicos que apontaram falhas críticas e foram ignorados por gestores que preferiam “manter o clima”. Analistas que pensaram soluções eficientes, mas foram interrompidos porque “não era o momento certo”. Empresas perdem, todos os dias, talentos que tentaram mudar para melhor… e acabaram afastados, desmotivados ou doentes.

 

Mas o sistema nem sempre vê. E quando vê, mascara como “problema de comportamento”.

 

E agora?

 

A pergunta não é “como salvar uma estrutura ruim”. A pergunta é: vale a pena se queimar por ela?

 

A resposta talvez não seja binária. Há estruturas em ruínas que ainda podem ser reconstruídas, com apoio, com estratégia, com coragem. Mas há outras que precisam ruir para que algo novo surja do entulho. Saber diferenciar uma da outra exige autoconhecimento, lucidez e, acima de tudo, senso de preservação.

 

A ética não exige martírio. O profissional comprometido não precisa se destruir para ser íntegro. E, às vezes, a decisão mais justa consigo mesmo é sair… antes que o fogo apague aquilo que havia de mais valioso: a vontade de fazer diferente.

 

Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 27/07/2025
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