... Expressividade ...

"Decifra-me mas não me conclua, eu posso te surpreender! - Clarice Lispector

Textos


 

Não sei bem como escrever isso... porque não se trata apenas de uma notícia. Trata-se de um luto coletivo. Hoje não se despede só um ex-presidente... se cala uma voz rara que ousou ser coerente até o fim.

 

Pepe Mujica morreu aos 89 anos... mas ninguém que plantou o que ele plantou morre de verdade.

 

Lembro das vezes em que ele esteve no Brasil... no Fórum Social Mundial, nas universidades, nos encontros com movimentos sociais... E não veio como chefe de Estado. Veio como alguém que falava de igual para igual com catadores, estudantes, líderes de base... sua presença era um manifesto vivo contra a vaidade política.

 

Enquanto muitos falavam de povo... Mujica morava com o povo. Enquanto os palácios se enchiam de promessas, ele seguia na sua chácara, entre cachorros e hortas, com a mesma blusa puída e a mesma ideia firme: não se trata de ter mais... mas de precisar de menos.

 

Se Gandhi dizia que a simplicidade é a mais alta forma de sofisticação... Mujica foi essa sofisticação sem verniz. Uma elegância que não cabia nos salões, mas que cabia no olhar de quem reconhece a verdade.

 

Ele não romantizava o socialismo... ele o praticava. E não com discursos de gabinete, mas com renúncia pessoal. Doou 90% do salário como presidente... recusou luxos... usou o poder como ferramenta, não como trono.

 

Enquanto líderes do mundo acumulam seguranças, blindagens e muros... Mujica abria a porteira da casa pra quem quisesse ouvir um mate e uma boa conversa.

 

Hoje... talvez sejamos nós que precisamos calar.

 

Pra entender... pra rever...

 

Pra aceitar que um homem assim não se substitui. Apenas se honra. Com ações, não com homenagens vazias.

 

Pepe foi amigo de Lula, sim... e também foi crítico quando precisou ser. Visitou Dilma... defendeu o Mercosul... falou ao Senado brasileiro em 2015 como quem sabia que estávamos perdendo a grandeza do projeto coletivo. Alertou sobre o consumismo, o egoísmo... disse que liberdade não é ter mais, mas viver com menos medo.

 

Não há estátua que caiba Pepe Mujica...

 

Não há manchete que traduza o que ele simbolizou.

 

Mas talvez... se a gente tiver coragem de olhar pra nossa própria covardia... a gente comece a entender o que ele queria dizer com “governar é uma extensão da vida, não da vaidade.”

 

Que o mundo seja gentil contigo, velho Pepe...

E que a gente tenha coragem de te continuar.

 

Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 13/05/2025
Copyright © 2025. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários

Tela de Claude Monet
Site do Escritor criado por Recanto das Letras