Sou a filha número oito.

Oito. Como se a vida tivesse insistido demais, ou talvez minha mãe tivesse tido poucas opções. Cresci ouvindo dela, sem rodeios nem romantismos: “se fosse hoje, não teria tido tudo isso de filhos.” Dizia com riso cansado nos olhos e a espinha curvada de tanto carregar o mundo nos braços. Na época, eu não entendia. Hoje, eu entendo mais do que gostaria.

Ser mãe nunca foi destino inevitável pra mim. Tentei quatro vezes. Quatro. E em todas, a trombofilia disse não. Primeiro em silêncio, depois com dor, e por fim com uma lucidez quase cruel. A biologia me negou — e, estranhamente, me libertou. Não sou mãe. E sou feliz.

Não é felicidade de quem se consola — é a alegria de quem reconhece que poderia ter sido, mas não foi. E que ainda assim é inteira. Que ama sob outras formas, cuida de outros jeitos, e constrói heranças invisíveis em outros corpos que não gestou.

Já julguei mães também. Principalmente aquelas que, exaustas, deixavam os filhos frente a uma tela ao invés de abrir um livro, uma caixa de lápis, ou uma tarde de conversa. Mas a vida ensina. E o cansaço mostra que, às vezes, o silêncio de um desenho animado salva o que ainda resta de sanidade em uma mulher sobrecarregada. Eu aprendi. Nem tudo é descaso. Muitas vezes, é sobrevivência.

Nesse Dia das Mães, não espero flores. Mas ofereço palavras. Às mulheres que geraram e às que não. Às que foram mães por acidente, por escolha, por falha no anticoncepcional, por projeto de vida ou por imposição social. Às que pariram, abortaram, perderam, desistiram ou seguiram.

Sou a filha número 08 de uma mulher que faria tudo diferente se pudesse voltar no tempo. E, talvez por isso, fiz tudo diferente. E está tudo bem.