![]() “Nem toda maternidade é poesia”
Nem toda mãe sonhou ser mãe. E nem toda mulher que sonha consegue ser.
Hoje, enquanto o mundo se curva diante das flores entregues em datas marcadas, eu me curvo diante das histórias que ninguém gosta de contar. As histórias das mães que se tornaram mães por esquecer a pílula, por não encontrar a farmácia aberta, por ceder ao gozo de um corpo que não quis interromper o desejo alheio com uma camisinha. Mães por acidente, por omissão, por desamparo. Por falta de opção.
Elas não aparecem nos comerciais. Não seguram seus bebês com trilha sonora suave e filtro de luz dourada. Elas choram no banheiro enquanto o filho dorme. Elas se perguntam, em silêncio, se ainda teriam escolha. E a resposta já foi dada — pelo teste de farmácia, pela ausência de apoio, pelo medo de ser julgada se dissesse "eu não queria isso agora".
E tem também as outras. As que querem ser mães com toda a alma — mas o corpo não responde. As que se entregam a agulhas, hormônios, exames, tabelas. As que veem, mês após mês, o sangue descendo como um fracasso. As que ouvem a sentença das doenças autoimunes como uma mordaça: “seu corpo não pode gerar”. Como se gerar fosse o único verbo que validasse uma mulher.
A maternidade, dizem, é instinto. Mas esquecem que é também estrutura. Que por trás da palavra "mãe" há um sistema que culpa, exige, cobra — e muitas vezes, abandona. Como Simone de Beauvoir disse: "Não se nasce mulher, torna-se mulher". Eu arriscaria dizer: não se nasce mãe. E nem toda mulher precisa ou consegue se tornar uma.
E nesse Dia das Mães, eu queria homenagear não as idealizadas — mas as reais.
As que tropeçaram na maternidade. As que choram no silêncio dos ultrassons vazios. As que escolheram não ser. As que foram escolhidas pela vida, mesmo sem querer.
Nem toda maternidade é poesia. E está tudo bem. O amor nasce, às vezes, do caos. E ele também é verdadeiro.
Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 11/05/2025
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