![]() Título: Do Mito ao Burnout: a Geração Z e as Doenças Corporativas sob a Ótica de Ernst CassirerAutoria: Simone T do Carmo (filósofa em construção e observadora do presente) - 3° Semestre/Março-25. Palavras-chave: Cassirer, Geração Z, burnout, mito contemporâneo, simbologia, trabalho.
Resumo:
Este artigo propõe uma leitura simbólica das chamadas "doenças corporativas" (burnout, ansiedade produtiva, depressão organizacional) a partir do Volume II da obra "A Filosofia das Formas Simbólicas" de Ernst Cassirer. Analisa-se como o pensamento mítico, longe de ser superado, ressurge na contemporaneidade através de práticas empresariais, discursos motivacionais e comportamentos digitais da Geração Z.
O texto investiga como esse grupo etário, muitas vezes classificado como frágil ou disperso, está na verdade criando novas formas simbólicas para enfrentar um colapso de sentido dentro das estruturas tradicionais de trabalho e existência.
Introdução:
Ernst Cassirer, em sua trilogia "A Filosofia das Formas Simbólicas", não trata apenas de linguagens filosóficas: ele nos oferece uma chave de leitura da experiência humana. No Volume II, onde analisa o pensamento mítico, ele não o rebaixa a um estágio pré-racional, mas o entende como um modo legítimo de organizar o mundo.
O mito, para Cassirer, é uma resposta simbólica ao caos, ao medo, à dor e ao inexplicável. Em um tempo onde dados são abundantes, mas sentido é escasso, a atualidade desse pensamento se impõe:
1. O mito nunca morre, ele se reconfigura:
O mundo corporativo contemporâneo, com sua linguagem performática, suas promessas de propósito, seus rituais de avaliação e seus líderes endeusados, é um terreno fértil para a reinvenção do mito. Cassirer nos alertaria: estamos diante de formas simbólicas que dão coesão ao que de outro modo seria insuportável. O "engajamento" virou uma oferenda diária. O "propósito" é o novo além-vida. O "colaborador do mês" ocupa o altar do reconhecimento.
2. Doença como linguagem simbólica:
As chamadas doenças corporativas não devem ser vistas apenas como falhas clínicas. São formas simbólicas do corpo e da mente responderem ao esgotamento de sentido. Burnout, ansiedade de performance, crises de identidade profissional — tudo isso revela a saturação dos símbolos antigos.
Quando o trabalho deixa de simbolizar criação ou pertencimento, ele se torna uma máquina de triturar subjetividades. E o corpo fala.
3. A Geração Z e a negação dos antigos mitos:
A Geração Z é herdeira de um mundo em colapso simbólico. Cresceram entre crises climáticas, redes sociais e a hiperexposição emocional. Eles já não creem nos mitos da estabilidade, do sucesso meritocrático, da empresa como família. São acusados de frágeis, mas talvez sejam apenas os primeiros a perceber que os símbolos antigos ruíram. Criam novas linguagens: memes como crítica, ironia como defesa, identidade como fluxo. Buscam sentido, mas sabem que não o encontrarão nos velhos templos corporativos.
4. Conexões entre mito, algoritmo e subjetividade:
Se o mito antigo dava nome aos deuses para proteger-se do caos, o algoritmo de hoje promete o mesmo: segurança, previsibilidade, recompensa imediata. Mas o que Cassirer mostraria é que, sem consciência simbólica, a tecnologia não liberta — ela apenas reorganiza o medo sob outra roupagem. A Geração Z talvez não tenha abandonado o mito: ela está recriando os seus, nos rituais do TikTok, nas narrativas dos jogos, na recusa de vínculos definitivos.
Conclusão:
Cassirer permanece urgente porque nos ensina que o ser humano não vive de dados, mas de símbolos. Quando as formas simbólicas deixam de representar a experiência humana real, o corpo adoece. O burnout, nesse sentido, não é só um colapso do corpo, mas da linguagem simbólica do trabalho. E talvez a Geração Z, com toda sua incerteza e fluidez, seja quem primeiro percebeu isso. Não estão perdidos — estão em busca de novos mitos para um mundo que já não oferece respostas antigas.
Referência Bibliográfica:
CASSIRER, Ernst. A filosofia das formas simbólicas: O pensamento mítico. Tradução de Cláudia Cavalcanti. São Paulo: Martins Fontes, 2004. v. 2. Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 18/04/2025
Alterado em 18/04/2025 Copyright © 2025. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. Comentários
Comentar com ![]() |