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"Decifra-me mas não me conclua, eu posso te surpreender! - Clarice Lispector

Textos


“Eis tua mãe, eis teu filho.” (Jo. 19,26-27)

https://www.recantodasletras.com.br/mensagensreligiosas/3600005

(Vestindo minha publicação de 2012, com o pensamento atual de estudante de Filosófia)

 

Essa frase não tem espetáculo.

Não tem milagre.

É só um gesto humano...

no meio de uma agonia divina.

 

Jesus, morrendo, ainda cuida.

Entrega Maria a João, e João a Maria.

Faz de dois corpos um cuidado.

Refaz laços no lugar onde tudo se rompe.

 

E eu penso…

quem hoje consegue ter esse olhar no meio da dor?

Quem, entre uma ferida e outra, ainda consegue ver o outro?

 

No meu texto de 2012 eu escrevi:

 

(...) “Ah! Volve a mim teus olhos, Maria piedosa…” (...)

 

Na época, eu ainda achava que Maria era só figura religiosa.

Hoje, eu sei que ela é símbolo de tudo que acolhe sem exigir.

Mãe é mais que mãe.

É a ancestral.

É a floresta.

É o ventre da Terra que gera e regenera…

Mesmo depois que tudo parece morto.

 

E nessa cena da cruz, Jesus me parece menos Deus e mais gente.

Alguém que ama até o último segundo.

Que vê a mãe ali, em pé, e não permite que ela fique sozinha.

Nem ela… nem João.

 

Se eu puxo Hannah Arendt pra essa conversa —

ela que entendeu tanto sobre responsabilidade e o poder de começar de novo —

talvez dissesse que esse gesto é o nascimento de uma nova política da compaixão:

um ato simples, íntimo…

que, no fundo, funda um novo mundo.

 

E aí eu provoco:

onde tá essa ética do cuidado hoje?

Nos discursos vazios?

Nas fotos de campanha?

Ou nas mãos que ainda seguram as de quem chora em silêncio?

 

Simone Weil, outra filósofa que sentiu Deus mais na dor do que na glória, dizia que “a atenção verdadeira é uma forma de amor.”

E talvez seja isso que essa frase de Jesus seja:

atenção até o fim.

Presença.

Amor que não abandona.

 

Hoje eu não preciso de dogma pra amar Maria.

Basta lembrar do rosto da minha mãe…

das mulheres que me sustentaram nas quedas…

da natureza que me acolhe sem exigir nada em troca.

 

E aí eu entendo:

quando Jesus disse “Eis tua mãe”...

Ele tava falando comigo também.

Com todo mundo que ainda sabe cuidar.

Mesmo ferido.

Mesmo em cruz.

Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 18/04/2025
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