O Peso da Facilidade

Ele chegou ao jantar com um sorriso ensaiado, uma camisa impecável e uma leveza quase artificial. Conversamos sobre viagens, trabalho, hobbies. Ele se descreveu como alguém “fácil de lidar”. Não guardava rancores, não tinha crises de ciúmes, nunca se irritava com coisas pequenas. Um espírito livre, fluindo como a brisa.

Deveria ser encantador. Mas não era.

Porque a verdade é que eu queria saber onde doía. Quais eram seus fantasmas, seus medos escondidos embaixo do tapete da alma. Eu queria saber se ele já havia se perdido em um silêncio desconfortável, se já sentira medo de ser abandonado, se alguma vez sua voz falhou ao tentar dizer o que realmente queria. Mas tudo o que ele oferecia era uma serenidade polida, uma ausência de arestas, uma perfeição sem vida.

A lembrança de outro encontro surgiu na minha mente. Uma mulher que, logo no primeiro café, me confessou que às vezes sentia um ciúme irracional. Que tinha medo de decepcionar os outros. Que às vezes se tornava impaciente quando estava cansada.

Achei aquilo bonito. Honesto. Humano.

Porque amar não é encontrar um ser celestial, mas alguém disposto a reconhecer suas sombras. Não é sobre viver sem conflitos, mas aprender a dançar entre os tropeços.

E naquele jantar perfeito, com uma companhia perfeitamente fácil, senti um cansaço imenso. Porque eu sabia: a dificuldade viria mais tarde, quando aquela aparente leveza não conseguisse mais sustentar o peso de tudo o que não foi dito.