![]() Ele se olhava no espelho todas as manhãs, mas nunca enxergava quem realmente era. O reflexo o desafiava, como se fosse um estranho, alguém distante. Não era o rosto marcado pelo tempo ou os olhos que carregavam histórias, mas algo mais profundo — a incapacidade de se reconhecer como o que o mundo insistia em dizer que ele era: alguém respeitável.
Para quem via de fora, ele era um vencedor. Subiu degrau por degrau, tropeçando em pedras que poucos teriam forças para carregar. Mas o que os outros não sabiam é que a cada vitória, ele sentia o peso de uma derrota passada, como um eco que nunca se dissipava. Era como se cada conquista reacendesse o fogo das promessas não cumpridas, das portas fechadas e dos "você não é suficiente" que ele ouviu tantas vezes.
Do ponto de vista psicológico, talvez Freud dissesse que ele estava preso em um ciclo de repetição, revivendo os traumas do passado em cada nova experiência. Já a psiquiatria moderna poderia chamar isso de "Síndrome do Impostor", aquela sensação sufocante de que, a qualquer momento, alguém vai perceber que ele não deveria estar ali, que tudo é um grande erro. Mas para ele, não havia rótulos. Era apenas um vazio que o acompanhava silenciosamente.
Ele começou a se perguntar: "Por que, mesmo estando aqui, no lugar que sempre desejei, ainda sinto que não pertenço?" Foi aí que um velho amigo, um terapeuta, lhe disse algo que ecoaria em sua mente por semanas: "O problema não é onde você está, mas como você se vê. Você ainda olha para si mesmo como aquele que perdeu, não como o que venceu."
As palavras pareciam simples, quase banais, mas tinham um peso imenso. Ele percebeu que sua mente havia construído um labirinto no qual ele se escondia de si mesmo. Ele era prisioneiro das expectativas, das promessas quebradas e da falta de reconhecimento de um passado que já não existia, mas que ainda comandava seu presente.
A psiquiatria fala sobre neuroplasticidade, a capacidade do cérebro de se reorganizar e criar novas conexões. Essa ideia o inspirou. "Se meu cérebro pode mudar, talvez minha visão de mim mesmo também possa", pensou. Decidiu, então, fazer algo diferente naquela manhã diante do espelho: olhou mais de perto. Tentou enxergar além das rugas, além das lembranças de fracassos. Procurou o homem que conseguiu recomeçar, que aceitou desafios e que hoje liderava outros com coragem, mesmo que internamente sentisse medo.
Não foi fácil. Todos os dias, ele se pegava escorregando de volta para os antigos padrões, mas a cada tropeço, ele se lembrava de uma frase que leu em um artigo sobre terapia cognitivo-comportamental: "Você não é seus pensamentos. Você é quem os observa." Isso o ajudou a entender que aquela voz interna que o chamava de impostor não era ele; era apenas uma sombra do passado que ele podia escolher ignorar.
Com o tempo, começou a perceber pequenas mudanças. A voz crítica em sua mente foi ficando mais baixa, enquanto uma nova voz surgia, mais compassiva, mais justa. Ele aprendeu a celebrar vitórias, mesmo as menores. Parou de esperar validação externa e começou a oferecer a si mesmo o reconhecimento que tanto buscava nos outros.
Naquela manhã, meses depois, ele olhou novamente para o espelho. Não era mais o mesmo. Ainda havia marcas do passado, mas elas agora pareciam medalhas de guerra, não cicatrizes de derrota. Pela primeira vez, ele viu quem realmente era: um homem forte, resiliente e, acima de tudo, humano.
E então ele sorriu. Não porque a jornada havia terminado, mas porque finalmente estava disposto a caminhar ao lado de si mesmo, e não contra. O espelho, enfim, refletia a verdade.
Tenho um orgulho imenso do homem lindo, do coração bom que ele se tornou... Monet Carmo
Enviado por Monet Carmo em 22/01/2025
Alterado em 22/01/2025 Copyright © 2025. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |